Vinte e três de agosto de 1922, cidade do Rio de Janeiro, então capital do país: nasce uma bebê de cabelo castanho (o qual, ainda em seu primeiro ano de vida, vira cachos louros) e olhos azuis. Eis Maria Antônia Portocarrero, chamada carinhosamente de Mariinha pela família. Zilda, a sua mãe, é senhora severa: acredita que a filha deve se casar, ter filhos e se dedicar à casa. Com o pai, Hermenegildo, a relação é outra: homem doce, é todo amor pela filha, chamando-a de princesa, de rainha. Amante das artes e com inclinação para o teatro, ele segue, contudo, carreira militar, sempre pronto a incentivar a liberdade interior de sua Mariinha.
Aos 14 anos, Tônia começa a namorar com um jovem rebelde e artista, com quem se casaria três anos mais tarde: Carlos Arthur Thiré. A bem dizer, ela enxerga o casamento como um caminho para se tornar independente da família. Em 1941, forma-se em educação física, o que lhe proporciona uma atitude de pescoço e ombros, como ela mesma fala. Tais aprendizados se refletem em uma consciência corporal e na preparação física para o trabalho cênico. Com Carlos, tem o seu único filho, Cecil Thiré.
Em viagem à França, Tônia cursa teatro com Jean Louis Barrault, professor que tenta convencê-la a abandonar as pretensões de atriz e ser “só bonita”. A jovem, porém, não desiste de sua vocação. De volta ao Brasil, estreia no cinema com uma ponta no filme Querida Susana (1947), de Alberto Pieralise. No entanto, é somente em 1949 que Tônia, em cena ao lado de Paulo Autran, se destaca com a peça Um Deus Dormiu Lá em Casa, trabalho pelo qual recebe o prêmio de Atriz Revelação da Associação de Críticos Cariocas.
Contratada pela Companhia Cinematográfica Vera Cruz em 1951, Tônia Carrero muda-se para São Paulo. Com a Vera Cruz, a sua carreira decola: projeta-se internacionalmente e passa a incorporar o arquétipo da diva. Na companhia, participa de clássicos como Tico-tico no fubá (1952), Apassionata (1952) e É proibido beijar (1954). Tamanha fama chega ao Palácio do Catete: Tônia recebe um convite para jantar com Getúlio Vargas, presidente do Brasil à época. O convite, feito por telefone, é coisa tão inesperada que Tônia acredita ser um trote.
Já uma estrela nacional, em 1953 é contratada pelo Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), companhia que contava com outro grande talento: Cacilda Becker. No TBC, Tônia atua em produções como Uma certa cabana (1953) e Uma mulher do outro mundo (1954). Nessa altura, envolve-se com Adolfo Celi, com quem, depois, funda a Companhia Tônia-Celi-Autran (CTCA), na qual faz Desdêmona em Otelo, obra-prima de Shakespeare, ao lado de Paulo Autran. O seu desempenho lhe rende o Prêmio APCT (hoje APCA, da Associação Paulista de Críticos de Arte) de Melhor Atriz. Além do lado artístico, Tônia, nesse momento, inicia a sua carreira de empresária de teatro.
Em 1967, ditadura militar; a arte e a cultura brasileiras sendo cerceadas. Esse é o cenário em que estreia a montagem de Navalha na carne com Tônia, Emiliano Queiroz e Nelson Xavier. Como a prostituta Neusa Sueli, a atriz desempenha um dos seus papéis mais emblemáticos, aquele que oferece a ela a maior dimensão de humanidade. Abandona padrões de beleza e vaidade, enche a boca de palavrões e dá vida ao texto de Plínio Marcos, tudo com direção de Fauzi Arap. O espetáculo marca tanto o reconhecimento profissional (recebe o Prêmio Molière de Melhor Atriz) quanto o posicionamento político de Tônia – ela toma a frente do processo de liberação da peça, inicialmente proibida pela censura.
Do cabelo cortado em camadas de Cristina de Pigmalião 70 (1970) ao então polêmico topless de Stella Simpson de Água-viva (1980), muitas personagens de Tônia integram o percurso da TV deste país. Já no início da televisão por aqui, ela participa de programas das extintas TVs Tupi e Excelsior, como os das décadas de 1950 e 1960. Ao todo, são 15 novelas de várias emissoras.
Tônia Carrero e Cecil Thiré, o seu único filho, compreendem bem o sentido de reciprocidade: os dois mantêm um laço de amor e confiança mútuos. A parceria é tamanha que chega ao teatro: em 1969, juntos em um tablado pela primeira vez, estreiam Falando de rosas, de Frank D. Gilroy e sob direção de Fauzi Arap. Na companhia um do outro, fazem diversos trabalhos, viram sócios e Cecil apelida a mãe de Tônica, palavra que define toda a dedicação da atriz.
De 1996 a 2000, Tônia apresenta o monólogo Amigos para sempre, cujo roteiro ela assina com Luís Arthur Nunes (também diretor do espetáculo). Trata-se de uma homenagem às lembranças de quem vive nela, gente que é a sua riqueza, a sua alegria, a sua esperança. Entre as amizades estão: Tom Jobim, vizinho tão carioca quanto a atriz; Rubem Braga, o eterno apaixonado por Mariinha; Vinicius de Moraes, o poetinha de uísque e samba; e Clarice Lispector, que gosta de ser maquiada por Tônia. E ela não se esquece de Paulo Autran, o amigo-irmão da vida inteira.
Alice e Álvaro, no fim, dançam o afeto em um salão de baile: assim Tônia surge, ao lado de Leonardo Villar, em Chega de saudade (2008), de Laís Bodanzky. O longa-metragem corresponde ao último trabalho da artista no cinema. Em 2007, despede-se do teatro com Um barco para o sonho, dirigida por seu neto Carlos Thiré. A última aparição pública acontece em 2009, quando do lançamento de sua biografia, escrita por Tânia Carvalho. Falece em 3 de março de 2018, aos 95 anos, deixando uma história que ressoa a exclamação tão usada por ela própria: ma-ra-vi-lha!
(*) O texto de Heloísa Iaconis e Icaro Mello, da equipe de jornalistas do Núcleo de Comunicação do Itaú Cultural, permeia o Almanaque repleto de fotos e curiosidades preparado pela instituição para ser distribuído para o público no espaço expositivo.
De 13 de agosto a 6 de novembro de 2022
Terças-feiras a sábado das 11h às 20h
Domingos e feriados das 11h às 19h
Pesquisa, concepção, curadoria e realização: Itaú Cultural
Cocuradoria: Luisa Thiré
Projeto expográfico: Kleber Montanheiro
Itaú Cultural
Avenida Paulista, 149 – Próximo à estação de metrô Brigadeiro.
Pisos 1º, 1ºS e 2ºS
Ingressos: gratuitos
Informações pelo telefone: (11) 2168-1777.
Atualmente, esse número funciona de segunda-feira a domingo, das 10h às 18h.
E-mail: atendimento@itaucultural.org.br
Programação Cênica
Navalha na Carne – Uma homenagem a Tônia Carrero
Com Luisa Thiré, Alex Nader e Ranieri Gonzalez
Dia 23 (terça-feira), às 20h
Sala Itaú Cultural
Capacidade: 224
Duração: 1h
Classificação Indicativa: 16 anos (violência psicológica, violência física, discriminação, vocabulário chulo)
Distribuição de ingressos: INTI. Consulte o site a partir de 17 de agosto, quando serão abertas as reservas
O Monstro de Olhos Azuis – Memórias de Tônia Carrero
Com Luisa, Carlos Arthur, João e Miguel Thiré
De 25 a 27 (quinta-feira a sábado), às 20h
Dia 28 (domingo), às 19h
Sala Itaú Cultural
Capacidade: 224
Duração: 1h
Classificação Indicativa: 12 anos (vocabulário culto)
Distribuição de ingressos: INTI. Consulte o site a partir de 17 de agosto, quando serão abertas as reservas
Protocolos
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